Vigência da súmula 377 do STF


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O STF editou em 1964 a súmula 377, restringindo os efeitos do regime da separação legal de bens:

no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento

A Súmula é anterior até mesmo à Lei do Divórcio, o que tem gerado divergências na doutrina a respeito de sua eventual derrogação. O Código de 1916 assim disciplinava a separação obrigatória de bens:

Art. 258. Não havendo convenção, ou sendo nula, vigorará, quanto aos bens, entre os cônjuges, o regime da comunhão universal.
Parágrafo único. É, porém, obrigatório o da separação de bens no casamento:
I. Das pessoas que o celebrarem com infração do estatuto no art. 183, nºs XI a XVI (art. 216).
II. Do maior de sessenta e da maior de cinquenta anos.
III. Do orfão de pai e mãe, embora case, nos termos do art. 183, nº XI, com o consentimento do tutor, ou curador
IV. E de todos os que dependerem, para casar, de autorização judicial (arts. 183, nº XI, 384, nº III, 426, nº I, e 453)

Art. 259. Embora o regime não seja o da comunhão de bens, prevalecerão, no silêncio do contrato, os princípios dela, quanto à comunicação dos adquiridos na constância do casamento.

Em 1977 a redação do artigo foi alterada pela Lei nº 6.515, de 1977 (Lei do Divórcio):

Art. 258 – Não havendo convenção, ou sendo nula, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime de comunhão parcial.
Parágrafo único. É, porém, obrigatório o da separação de bens no casamento:
I. Das pessoas que o celebrarem com infração do estatuto no art. 183, nºs XI a XVI (art. 216).
II. Do maior de sessenta e da maior de cinquenta anos.
III. Do orfão de pai e mãe, embora case, nos termos do art. 183, nº XI, com o consentimento do tutor, ou curador
IV. E de todos os que dependerem, para casar, de autorização judicial (arts. 183, nº XI, 384, nº III, 426, nº I, e 453)

Art. 259. Embora o regime não seja o da comunhão de bens, prevalecerão, no silêncio do contrato, os princípios dela, quanto à comunicação dos adquiridos na constância do casamento.

O Código Civil de 2002 passou a disciplinar o assunto no artigo 1.641:

Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:
I – das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;
II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.344, de 2010)
III – de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

Parte da doutrina entende que Súmula foi revogada pelo advento do Código Civil de 2012, como podemos acompanhar no artigo A súmula 377 do STF e a sua aplicabilidade no Código Civil de 2002.

Não deve prevalecer o entendimento que a súmula foi revogada, pois as disposições de ambos os códigos permanecem praticamente as mesmas. O problema está na ausência do disposto no artigo 259 do Código de 1916, no novo Código Civil, nesse sentido elucida Maria Berenice Dias:

Como o Código Civil não reproduziu o dispositivo da lei anterior, que determinava, no silêncio do pacto antinupcial, a comunicação dos bens adquiridos na constância do casamento, vozes surgiram sustentando que a súmula teria sido derrogada. A alegação é que o Código atual simplesmente desprezou a orientação da justiça e derrogou a súmula. Assim, para determinar a repartição dos aquestos, é necessária prova da efetiva colaboração na aquisição do patrimônio. Porém, a súmula não havia sido editada em razão de indigitada previsão legal. Seu fundamento é que a convivência leva à presunção do esforço comum na aquisição de bens. Procurou a justiça amenizar os efeitos nefastos da lei que pune quem desobedece à recomendação de não casar (Dias, Maria Berenice. Manual de Direito das Família, 9ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2013. pg. 260).

A Jurisprudência é uníssona no sentido interpretado pela Maria Berenice, quanto à validade da súmula, vejamos:

Ante a mudança de competência do STF após a constituição de 1988, a análise de legislação infraconstitucional passou para a competência do STJ, não cabendo mais recursos ao STF. Essa postura é confirmada em diversas decisões monocráticas da Corte Suprema, neste sentido:

Ainda que pudesse ser superado esse óbice – o que não se dá na espécie -, melhor sorte não acudiria o pleito do Agravante, pois o acórdão recorrido evidencia que o Tribunal a quo apreciou a matéria à luz da legislação infraconstitucional aplicável à espécie ‘ Código Civil -, razão pela qual não ocorre ofensa constitucional direta, única a permitir o processamento do recurso extraordinário, nos termos do art. 102, inc. III, alínea a, da Constituição da República. Nesse sentido: ‘ EMENTA: AGRAVO REGI MENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO (…) CONTROVÉRSIA DECIDIDA COM BASE NO CÓDIGO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DA ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL E DO REEXAME DE PROVAS (SÚMULA 279). OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. Imposição de multa de 1% do valor corrigido da causa. Aplicação do art. 557, § 2º, c/c arts. 14, inc. II e III, e 17, inc. VII, do Código de Processo Civil ‘ ( AI 666 . 068 -AgR, de minha relatoria , Primeira Turma, DJ E 7 . 11 .2008). E ainda: RE 536 . 262 -AgR, Rel. Min. Cezar Peluso, Segunda Turma, DJE 9 . 5 .2008.
Ressalte-se, por fim, que a Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal foi editada na época em que o Supremo Tribunal tinha competência para examinar a legislação federal, competência esta que, com a Constituição de 1988, foi atribuída ao Superior Tribunal de Justiça. A ofensa aos dispositivos constitucionais, se houvesse, seria de forma indireta (AI 712638 / PR – STF – DJe-049 DIV. 13/03/2009 – Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA).

São poucos os precedentes do STJ abordando a questão da súmula 377 do STF, mas todas favoráveis a aplicação da súmula:

Embora tenha prevalecido no âmbito do STJ o entendimento de que o regime aplicável na união estável entre sexagenários é o da separação obrigatória de bens, segue esse regime temperado pela Súmula 377 do STF, com a comunicação dos bens adquiridos onerosamente na constância da união, sendo presumido o esforço comum, o que equivale à aplicação do regime da comunhão parcial (REsp 1171820 / PR -3ª Turma do STJ – Pub. DJe 27/04/2011 – Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI).

No entendimento do STJ, se comunicam os bens adquiridos na vigência da separação legal de bens, sem necessidade da prova do esforço comum, nesse sentido, o REsp 154896 / RJ. O TJ/SP segue a linha dos tribunais superiores, mantendo a aplicação da súmula 377:

Terreno adquirido anteriormente ao casamento pertence exclusivamente ao “de cujus” Prédio construído na vigência do casamento e do Código Civil de 1916 Aplicação da Súmula 377 do STF Construção deve ser destacada e partilhada em 50% (cinquenta por cento) para a viúva – Embargos acolhidos (Embargos de declaração 0136285-49.2013.8.26.0000 – 6ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP – jul. 03/04/2014 – rel. Des. Fortes Barbosa ).

No mesmo sentido, Apelação 0010156-98.2009.8.26.0659 (7ª Câmara), AI 0056958-26.2011.8.26.0000 (10ª Câmara). O TJ/SP enfrentou a questão da validade da Súmula 377, no Agravo de Instrumento nº 0122270-75.2013.8.26.0000 (10ª Câmara, 2013), entendendo a plena vigência do dispositivo e registrando que presume-se o esforço comum, salvo prova em contrário.

O Conselho Superior da Magistratura (TJ/SP), no acórdão da Apelação nº 990.10.017.578-5 (2010) enfrentou o assunto, favorável a aplicação da súmula 377.

Existem duas exceções à aplicação da Súmula 377: os bens adquiridos durante o regimento de casamento com separação obrigatória somente não se comunicarão:

  • Se no pacto antinupcial constar a separação absoluta de bens;
  • Existir prova que o imóvel foi adquirido com o esforço de apenas um dos cônjuges, como no caso de venda de um bem adquirido antes do casamento e a posterior aquisição de outro de valor semelhante.

Referência

  1. Foto: Photl.com